Europa e o
Mundo
CARTA ABERTA AO DR. MÁRIO SOARES
Desculpe-me que, com uma certa brutalidade lhe diga de entrada que o Sr Dr. me desiludiu.
A razão da minha desilusão baseia-se no facto de me ter renascido a esperança de, enfim pagar um pouco menos de impostos, mas o Sr Dr. recuou na questão do imposto europeu.
Uma tal abrupta brutalidade requer, evidentemente explicações. É o que tento fazer em seguida.
As vantagens de uma Federação
Tive alguns professores, entre eles por exemplo Hans Morgenthau ou Raymond Aron que sempre me disseram que Federações há muitas no mundo, mas de nome, pois Federações de facto apenas se conhecem duas: a Confederação Helvética e os Estados Unidos da América. Mas como os Professores. também podem dizer asneiras não há nada de melhor do que comprovar os factos pela experiência. Foi precisamente o que fiz e após quarenta anos de vivência em Genebra, tornei-me cidadão de Meyrin, depois de Genebra e enfim da Suíça (para os que conhecem pouco destas coisas informo que Meyrin é a minha freguesia).
Tudo isto para lhe dizer que sou um inequívoco federalista. Aliás por esta razão e porque tanto desejo este regime para a nossa velha Europa fico todo contente quando o Dr. Paulo Portas diz que é contra a Federação Europeia. Contradição? Nem tanto, é que há cerca de duas semanas ouviu-o, com o vigor que lhe é habitual, explicar na televisão porque razão era pela Europa das nações e contra a Federação. Depois desta explicação disse para comigo próprio: Deus queira que ele continua a ser contra a Federação...
Aliás como o Sr Dr. disse e muito bem não se pode compreender como é que se pode contrapor a Europa das nações à Europa federal. É evidente que a melhor maneira de salvaguardar a identidade de nações diferentes é agrupá-las numa Federação. Desculpe voltar ao tema da Suíça. Tudo começou em 1291 quando os três “primitivos” se reuniram na planície do Grutli e face às ameaças dos Habsburgos contra a sua integridade e identidade prometeram que apenas obedeceriam às leis que eles próprios se atribuíssem. Hoje são vinte e seis nações e para todas elas uma das principais razões da sua adesão à Confederação foi a necessidade de preservar a sua independência e identidade.
É precisamente por isso que, em lugar de andarmos sempre aos gritos contra o imperialismo devastador americano, faríamos melhor avançar com o nosso federalismo sem dúvidas, a melhor maneira de fazer face aos exagerados apetites do país que nos quer fazer adoptar Coca Cola e hamburger como símbolos máximos da civilização “moderna”.
Uma redução de impostos?
Mas como pagar menos impostos? Seria longo a explicar mas vou tentar repetir uma conversa que tive com os meus estudantes conscientes de que fiz raciocínios matemáticos seguindo atalhos de um rigor científico duvidoso.
Tomemos apenas três exemplos (outros muitos poderia haver) que reduziriam as despesas de uma Europa Federal. A política externa comum vai levar-nos a que, por esse mundo fora onde existem dezasseis Embaixadas (quinze países mais a Representação da UE) passaríamos a ter uma única Embaixada que talvez não fosse muito maior do que uma embaixada francesa, britânica ou alemã.
A investigação científica, já sem falar do “chauvinismo” que leva a que cada país insista em fazer a mesma que os outros já fazem, já provou a sua eficiência federal com menos custos. Basta só falar da Agência Espacial Europeia ou do Centro Europeu da Investigação Nuclear.
E, por último o exército único. Hoje todos insistimos em possuir os nossos “brinquedos” guerreiros quando poderíamos racionalizar e, muito provavelmente reduzir tudo isso, pois as necessidades de defesa de uma Europa única talvez não sejam as mesmas que as de 25 países que, muitas vezes mais não fazem do que duplicar-se. Mas, onde os jovens ficaram francamente entusiasmados foi quando lhes disse que seria muito provável que nessas condições se chegasse à conclusão de que há submarinos a mais e que provavelmente nos enviarão dois ou três para guardar as nossas costas o que nos evitaria de ter que comprar submarinos em...”leasing”. “Dieu que la guerre est jolie”.
É evidente que tudo isto levaria a uma redução de despesas militares e, normalmente, no quadro de uma solidariedade federal, a uma redução ainda maior para os países mais pequenos e menos ricos. Isto se, entretanto, os Governos não aproveitassem para aumentar o nível dos impostos nacionais. É evidente que não me estou a referir a este ou outro Governo. Em matéria de impostos eles são todos famintos.
Eis porque depois de ter ganho a esperança de pagar menos impostos fiquei desiludido com o seu recuo, certamente compreendendo que tal se deve à política trauliteira tão habitual no nosso país.
Mas a minha tristeza que frisa quase o desespero é que com a sua proposta encarei logo a hipótese de podermos ter uma legislação fiscal vinda de Bruxelas que concerteza terminaria, em Portugal, com o meu grupo: O GRUPO DOS PATETAS QUE PAGAM IMPOSTOS.
Luís Carlos Nunes